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sexta-feira, 25 de junho de 2010
segunda-feira, 7 de junho de 2010
Conto pro Dia dos Namorados!! S2
Era uma vez um jovem mago rico, bonito e talentoso, que observou que seus amigos agiam como tolos quando se apaixonavam, se enfeitando, andando aos saltos e corridinhas, perdendo o apetite e a dignidade. O jovem mago resolveu jamais se deixar dominar por tal fraqueza, e recorreu às artes das trevas para garantir sua imunidade. Sem saber do seu segredo, a família do mago achava graça de vê-lo tão distante e frio.
“Tudo mudará”, vaticinavam eles, “quando uma donzela atrair seu interesse!”
O jovem mago, porém, permanecia impassível. Embora muita donzela se sentisse intrigada por seu ar altivo e recorresse às artes mais sutis para agradá-lo, nenhuma conseguia tocar seu coração. Ele se vangloriava de sua indiferença e da sagacidade que a produzira.
O frescor da juventude foi dissipando-se e os jovens de mesma idade e posição que o mago começaram a casar e a ter filhos. “O coração deles deve ser apenas uma casca”, desdenhava ele mentalmente, observando o ridículo comportamento dos jovens pais ao seu redor, “ressecada pelas exigências desses pirralhos chorões!” E mais uma vez ele se felicitou pela sabedoria da opção que fizera no primeiro momento.No devido tempo, os pais do mago, já idosos, faleceram. O filho não lamentou a morte deles; ao contrário, considerou-se abençoado por terem desaparecido. Agora ele reinava sozinho em seu castelo. Depois de transferir o seu maior tesouro para a masmorra mais profunda, ele se entregou a uma vida desregrada e farta, na qual seu conforto era o único objetivo dos inúmeros criados. O mago estava convencido de que devia ser alvo da imensa inveja de todos que contemplavam sua solidão esplêndida e despreocupada. Feroz, portanto, foi sua raiva e desgosto, quando um dia ouviu dois dos lacaios discutindo a sua pessoa.
O primeiro criado manifestou pena do mago que, com tanto poder e riqueza, continuava sem alguém que o amasse. Seu colega, entretanto, desdenhou, perguntando por que um homem com tanto ouro e dono de tão esplêndido castelo não fora capaz de atrair uma esposa.
Tal conversa desferiu um terrível golpe no orgulho do mago que os ouvia.
Ele decidiu imediatamente escolher uma esposa, e uma que fosse superior a todas as existentes. Possuiria uma beleza assombrosa e provocaria inveja e desejo em todo homem que a contemplasse; descenderia de uma linhagem mágica para que seus filhos herdassem excepcionais dons de magia; e seria dona de uma fortuna no mínimo igual à dele, para garantir sua confortável existência, apesar do acréscimo de pessoas e despesas. Encontrar tal mulher talvez levasse cinqüenta anos, mas aconteceu que, no dia seguinte à sua decisão, chegou à vizinhança, em visita a parentes, uma donzela que correspondia a todos os seus desejos. Era uma bruxa de prodigioso talento e dona de grande riqueza. Sua beleza era tanta que mexia com o coração de todos os homens que a contemplavam, isto é, todos, exceto um. O coração do mago não sentiu absolutamente nada. Contudo, a moça era o prêmio que ele buscava, e, assim sendo, começou a cortejá-la.
Todos que notaram a mudança no comportamento do mago ficaram surpresos e disseram à donzela que ela tivera êxito, onde uma centena de outras havia fracassado.
A jovem, por sua vez, sentiu ao mesmo tempo fascínio e repulsa pelas atenções do mago. Ela pressentiu a frieza que havia sob o calor de suas lisonjas, pois jamais conhecera um homem tão estranho e distante. Seus parentes, contudo, consideraram essa união extremamente desejável e, muito interessados em promovê-la, aceitaram o convite do mago para um grande banquete em homenagem à donzela.
A mesa, carregada com peças de ouro e prata, cotinha os mais finos vinhos e as comidas mais suntuosas. Menestréis dedilhavam alaúdes de cordas sedosas e cantavam um amor que o seu senhor jamais sentira. A donzela sentou-se em um trono ao lado do mago, que lhe falava suavemente, empregando palavras de carinho que roubara dos poetas, sem a mínima idéia do seu real significado. A donzela ouvia, intrigada, e por respondeu:
“Você fala bonito, mago, e eu ficaria encantada com suas atenções, se ao menos acreditasse que você tem coração!” O mago sorriu e lhe respondeu que, quanto a isso, ela não precisava temer. Pediu-lhe que o acompanhasse e, conduzindo-a para fora do salão, desceu à masmorra trancada à chave onde guardava o seu maior tesouro.
Ali, em uma caixa de cristal encantada, encontrava-se o coração pulsante do mago.
Há muito tempo desligado dos olhos, ouvidos e dedos, o coração jamais se deixara cativar pela beleza, ou por uma voz musical, ou pelo tato de uma pele sedosa. A donzela ficou aterrorizada ao vê-lo, pois o coração encolhera e se cobrira de longos pêlos negros.
“Ah, o que você fez!”, lamentou ela, “Reponha o coração no lugar a que pertence, eu lhe imploro!”
Ao perceber que isto era necessário para agradá-la, o mago apanhou a varinha, destrancou a caixa de cristal, abriu o próprio peito e repôs o coração peludo na cavidade vazia que outrora ocupara.
“Agora você está curado e conhecerá o verdadeiro amor!”, exclamou a donzela e abraçou-o.
O toque dos macios braços alvos da donzela, o som de sua respiração no ouvido dele, o aroma dos seus cabelos dourados; tudo isso penetrou como uma lança o seu coração recém-despertado. Mas o órgão se corrompera durante o longo exílio, cego e selvagem na escuridão a que fora condenado, seus apetites tinham se tornado vorazes e perversos.
Os convidados ao banquete notaram a ausência do anfitrião e da donzela. A princípio despreocupados, começaram, porém, a se sentir ansiosos à medida que as horas passavam e, por fim, decidiram revistar o castelo. Acabaram encontrando a masmorra, onde uma cena aterrorizante os aguardava. A donzela jazia morta no chão, de peito aberto, e ao seu lado ajoelhava-se o mago enlouquecido, segurando em uma das aos ensangüentadas um grande e reluzente coração, que ele lambia e acariciava, jurando trocá-lo pelo seu.
Na outra mão, ele empunhava a varinha, tentando induzir o coração murcho e peludo a sair do próprio peito. O coração, porém, era mais forte do que ele e se recusou a renunciar ao controle dos seus sentidos ou a retornar à urna em que estivera trancado por tanto tempo. Diante do olhar aterrorizado dos convidados, o mago atirou para um lado a varinha e agarrou uma adaga de prata. Jurando jamais ser dominado pelo próprio coração, arrancou-o do peito. Por um momento, o mago permaneceu de joelhos, triunfante, segurando um coração em cada mão; em seguida caiu atravessado sobre o corpo da donzela e morreu.
Dos “Contos de Beedle, o Bardo”